A Jornada da Esperança

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Puerto La Cruz, uma pequena cidade localizada na costa venezuelana, é o ponto de partida para praias repletas de beleza e tranquilidade. Entretanto, a grave crise econômica e humanitária que atinge a Venezuela afugentou não apenas os turistas da região, como também os moradores, que saíram em busca de refúgio nas nações vizinhas.

A história que vem a seguir é de uma dessas famílias, que deixou pais, irmãos, amigos e empregos para trás à procura de algo muito mais simples do que uma vida melhor; eles só queriam conseguir a cirurgia reparadora da fissura labiopalatina para sua bebê.

O início dessa história é em outubro de 2019, quando um senhor americano viu uma família de 6 pessoas em uma praça no município de Iquitos, no norte do Peru. Yoel, o pai, e Yelisbeth, a mãe, estavam sentados com as quatro filhas. Uma delas era a pequena Elizabeth, então com apenas 3 meses de vida. Nascida com fenda no lábio e no palato, a bebê também tinha uma malformação na mãozinha esquerda.

O americano viu o lábio da menininha e falou sobre a Operação Sorriso. Yoel, então, contatou a matriz da Operação Sorriso nos Estados Unidos via redes sociais. A equipe da ONG passou para ele os contatos da fundação peruana. Mas Yoel foi informado que a próxima missão aconteceria em Lima, muito distante de onde estava.

Sem condições financeiras para pagar a passagem, Yoel se comunicou com a fundação do Brasil para ver se tinha alguma missão perto da fronteira. Ao ser informado de que era venezuelano, recebeu a indicação de tentar conseguir a cirurgia junto à fundação de seu país natal, porém não havia missões agendadas para datas próximas.

Logo, voltou a falar com a Operação Sorriso do Brasil pelas redes sociais e soube que dentro de um mês e meio aconteceria um programa humanitário em Porto Velho, a pouco mais de 1100km de distância.

Decidido a conseguir a cirurgia gratuita para sua filha, Yoel foi a um programa de rádio, em que contou sua história e os planos de vir para o Brasil para participar da missão cirúrgica. Comovido com o relato do venezuelano, o dono de uma empresa de barco ligou para a rádio e ofereceu as passagens para que a família viajasse até Santa Rosa de Yavarí, última cidade peruana antes da fronteira com o Brasil.

De Iquitos (Peru) a Tabatinga (Brasil)

O trajeto de Iquitos até Santa Rosa de Yavarí começou em 14 de novembro e levou quase 3 dias. Yoel foi em um barco e a mãe com as filhas, em outro. O desafio seguinte era conseguir juntar dinheiro para pagar a passagem até o município de Tabatinga, cidade amazonense do outro lado da divisa. A solidariedade do povo mais uma vez fez a diferença. “Contamos com a ajuda de muita gente. Pessoas que nunca havíamos visto na vida nos ajudaram das mais diversas formas,” lembra o casal.

De Tabatinga (AM) a Manaus (AM)

Ao longo da viagem, a família sobrevivia vendendo chocolates e alguns de seus últimos bens. O trecho seguinte, entre Tabatinga a Manaus, tinha mais de 900km.

Após quase 4 dias de viagem, chegaram na capital amazonense. No caminho, conheceram mais uma pessoa, Cristiana, que generosamente ofereceu hospedagem e alimentação para eles.

Sabendo que o sonho de conseguir a cirurgia estava cada vez mais próximo, em Manaus a família precisou fazer mais alguns pequenos sacrifícios. A cadela que os acompanhava ficou na casa de Cristiana. A geladeira foi vendida. Um dos tuk tuk – um tipo de triciclo motorizado – que trouxe metade da família, também ficou para trás. Os seis seguiriam viagem em apenas um tuk tuk.

Eles conversaram com caminhoneiros para saber as condições da estrada e marcaram a data de saída. “Um dia dissemos: vamos amanhã! Colocamos o despertador para as três da manhã e saímos”, conta Yoel.

De Manaus (AM) a Porto Velho (RO)

A estrada começou boa, mas no decorrer do dia, o asfalto deu lugar à terra batida e o trajeto parecia não ter fim. “Era uma reta infinita até o horizonte. E nas margens, só víamos mata. Em um determinado ponto, a situação ficou angustiante. Andamos centenas de quilômetros sem passar por nenhuma comunidade,” lembra.

No meio da tarde, chegaram na cidade de Igapó-Açu. A terra foi trocada pelas águas. A viagem de balsa trouxe um alívio na paisagem, mas Yoel sabia que ainda teriam um longo caminho pela frente. Quase 400km, para ser exato.

Ao descerem da balsa e retomarem a viagem pela estrada, mais sol, mais calor, mais poeira. Cansada, a família parou no acostamento na esperança de conseguir uma carona. E, mais uma vez, o destino se encarregou de ajudá-los.

Ao avistar um caminhoneiro no horizonte, Yoel começou a sinalizar. O caminhão foi desacelerando, até parar. Como não tinha muita mercadoria, o motorista se ofereceu para levar a família até Porto Velho em troca de R$ 150. Negócio fechado.

A interminável viagem continuou. Apesar de estarem indo mais rápido, Yelisbeth ainda lembra do cheiro inebriante de gasolina na carreta. À noite, após longas horas na estrada, o condutor resolveu parar para descansar. Um grande susto os fez lembrar que estavam na floresta amazônica. “Ouvíamos ruídos vindos da mata e, de repente, vi pares de olhos brilhantes saírem do meio das plantas.” Eram onças. “Só pensava nas meninas. Eram minha única preocupação,” diz.

A viagem chegou ao fim na manhã seguinte, um domingo. Cansados, ainda encontraram forças para ir até o hospital onde aconteceria a triagem, distante do centro de Porto Velho. Ao chegarem, deram de cara com algumas pessoas da equipe da Operação Sorriso e foram avisados de que estavam adiantados. A missão começaria apenas na segunda-feira. Mas já sabendo da vinda da família por conta daquele primeiro contato via redes sociais, ninguém do staff conteve a emoção! Família e equipe choraram juntos.

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Elizabeth passou pela avaliação médica no dia seguinte e foi selecionada para a cirurgia. Na quarta-feira, pai e mãe demonstravam um misto de nervosismo com gratidão. “Foi muito sacrifício! Mas quando chegamos aqui, não imaginávamos que seríamos recebidos com tanto carinho e amor por todos,” conta Yoel com lágrimas nos olhos. A família pensa até em se estabelecer no Brasil, pois gostaram muito do povo.

Ao ser chamada para buscar sua bebê depois da cirurgia, Yelisbeth não conseguia esconder o nervosismo no olhar. Ao ver o rosto da pequena Elizabeth sem a fenda, não conteve a emoção. Yoel acompanhou tudo do lado de fora, por meio de vídeos que ela enviava pelo celular. E, ao ver o novo rosto de sua filha, deixou as lágrimas escorrem de novo.

Afinal, o sacrifício todo tinha valido a pena.

E você, até onde iria para conseguir operar seu filho?

 

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“Toda criança que nasce com deformidade facial é nossa responsabilidade. Se nós não cuidarmos dessa criança, não há nenhuma garantia de que outra pessoa o fará.”

- Kathy Magee, cofundadora e presidente da Operação Sorriso