A promessa cumprida

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No estado do Ceará, nordeste do Brasil, ao longo de uma estrada de terra batida, num dia quente, Antonia Samia toma uma água de coco em uma barraca com seu pai e sua irmã. A área foi atingida por uma seca há mais de cinco anos e o vento forte cobre tudo e todos com uma fina camada de poeira.

A vida é difícil para muitos nesta região árida e desolada, em uma nação mais conhecida por suas florestas tropicais, pelo grande rio Amazonas e pelas paisagens urbanas do Rio de Janeiro e de São Paulo. Assim como outros agricultores da região, Iranildo, pai de Antonia, teve de lidar com as consequências da longa seca. Em épocas como essa, ele só consegue produzir o suficiente para alimentar sua grande família. Mesmo quando as condições são mais favoráveis, Iranildo ganha uma renda baixa e inconsistente com a venda de milho, feijão e mandioca que sobra.

Neste dia, Iranildo e Antonia riem e aproveitam o tempo juntos, enquanto recordam o passado. O marido de Antonia, Alan, trabalha na barraca de coco e, aos 19 anos, abre um grande sorriso quando seus olhos se encontram. Em momentos como esse, é quase impossível imaginar que houve um tempo em que Antonia não tinha muitos motivos para sorrir.

Esse tempo foi há 11 anos, antes de sua fissura labial ser reparada pela Operação Sorriso.

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A patologia da fissura atormenta a família de Antonia há muito tempo. Ela é a quinta geração seguida que é atingida pela deformidade. Iranildo e a mãe de Antonia, também chamada Antonia, ficaram devastados quando viram sua quinta filha nascer com fissura labial, mas aquilo não era nada em comparação com o amor que sentiam por suas crianças. Diferente de tantos outros bebês que nascem com fissura, Antonia teve a sorte de conseguir amamentar sem dificuldades.

Entretanto, em uma família com 9 pessoas para sustentar, não havia como Iranildo pagar pela cirurgia de Antonia. Mesmo quando ele ouviu falar da missão inaugural da Operação Sorriso em Fortaleza, em 1997, pouco depois do nascimento de Antonia, Iranildo não tinha dinheiro para pagar o ônibus até a capital, onde o mutirão aconteceria, nem podia ficar muito tempo longe da fazenda. Tudo o que pôde fazer foi uma promessa para Antonia, com a esperança de que a cumpriria um dia: “Juro que um dia arrumaremos seu lábio”.

Por um lado, ela teve a sorte de crescer saudável em termos físicos, mas o estresse emocional que Antonia sofrera era inevitável. Quando começou a frequentar a escola, ela era constantemente atormentada e sofria bullying de seus colegas de classe por conta de sua fissura labial. Muitas vezes, Antonia chegava em casa aos prantos, dizendo à mãe que não queria mais estudar. Os apelidos horríveis que lhe davam eram dolorosos demais. 

Quando Antonia tinha 8 anos, sua tia, Leidinha, persuadiu Iranildo a levar a filha para Fortaleza, para ter a chance de receber uma cirurgia gratuita na missão médica da Operação Sorriso. Desde esse dia, Antonia chama sua tia Leidinha de “anjo”.

Os três – Iranildo, Antonia e Leidinha – fizeram o percurso de mais de 3 horas no ônibus e chegaram ao local da missão. Antonia estava assustada por viajar sem sua mãe, que ficou em casa para cuidar de filhos mais novos.

Antonia lembra de brincar com outras crianças no hospital, enquanto aguardava na triagem dos pacientes. No fim do dia, Iranildo conseguiu cumprir a promessa que havia feito a filha.

Antonia era nova demais para entender as consequências da cirurgia e o quanto ela mudaria sua vida. Mesmo com os esforços dos voluntários para acalmá-la, ela chorava enquanto era levada para a sala de cirurgia. Ela não entendia porque seu pai não podia acompanhá-la. Iranildo tranquilizou a garota, explicando que ele estaria ali, naquele mesmo lugar, esperando por ela depois da operação.

Quando viu a filha pela primeira após a cirurgia bem-sucedida, Iranildo não conseguia acreditar. “Antonia era a criança mais linda do mundo. As outras (crianças que passaram pela cirurgia) eram bonitas, mas Antonia era a mais linda”, disse Iranildo.

Antonia lembra de acordar da anestesia, sentir seu rosto meio estranho e o lábio inchado. O que ela mais desejava era voltar para casa, para o abraço carinhoso de sua mãe. Quando chegaram, a mãe de Antonia chorou de alegria ao ver o novo sorriso da filha. Seus pais decidiram ainda que ela não voltaria à escola até seu lábio estivesse bom.

Quando esse momento chegou, a professora reuniu os colegas de sala de Antonia – antigos atormentadores – e lhes perguntou: “Vocês viram a Antonia? Ela passou por uma cirurgia e é bonita como sempre foi”. A professora continuou explicando que Antonia sempre fora como seus colegas, que qualquer um deles poderia ter nascido com uma fissura, e que Antonia não tinha escolhido nascer com aquela condição.

Dali em diante o bullying parou e Antonia fez amizades e aproveitou a vida social, seguindo com seus estudos.

Enquanto isso, o excelente resultado e a fotogenia de Antonia atraíram a atenção de uma famosa marca de pasta de dentes. Por incrível que pareça, a garota que antes era atormentada por conta de sua aparência, acabou se tornando o rosto de uma campanha de publicidade no Brasil.

Em outubro de 2016, Antonia visitou a missão médica da Operação Sorriso em Fortaleza. Ela ajudou os pacientes e seus pais, conversou com eles para acalmá-los e ainda lhes mostrou uma foto de seu rosto antes do procedimento. O “depois” da cirurgia estava ali, em carne e osso, a prova viva do trabalho da Operação Sorriso, que transforma vidas.

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Antonia disse que a experiência despertou memórias poderosas e que ajudar esses pais e crianças lhe trouxe muita alegria. “Se não fosse pela Operação Sorriso, eu não estaria aqui, contando minha história”, declarou Antonia, que deseja se tornar uma médica ou enfermeira para, um dia, ajudar crianças como ela. “Obrigada por me trazer de volta a felicidade”.

 

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“Toda criança que nasce com deformidade facial é nossa responsabilidade. Se nós não cuidarmos dessa criança, não há nenhuma garantia de que outra pessoa o fará.”

- Kathy Magee, cofundadora e presidente da Operação Sorriso